Serendipity
A vida de expatriado tem coisas interessantes. Uma destas, porventura crucial, é sermos confrontados com a nossa capacidade de adaptação, de assimilar ditos choques culturais. Muitos daqueles que pela primeira vez se encontram estacionados num país estrangeiro experimentam tremendas dificuldades e, ao fim de uns poucos meses, talvez um ano, quando a sensação do novo se esvai e a saudade invade, desesperam por um rápido retorno. Quando decidi vir para o Japão, várias vozes me advertiram para o pior, que muito provavelmente não conseguiria enfrentar esta distante nação, de hábitos tão diferentes. Longe, quase um mundo de distancia, das minhas raízes. Sozinho, vir para o Japão viver, era duro, coisa de loucos. Tempus fugit, e passaram já quase seis meses desde que aqui cheguei. Devo dizer que, por ora, o balanço é positivo. Pontilhado por momentos de frustrantes barreiras comunicativas, de uma ansiedade constante relativa a atropelos dos inúmeros e invisíveis códigos de conduta japonesa. Mas os nipónicos são discretos o suficiente para fecharem os olhos, deixarem passar. Talvez seja por me encontrar numa situação algo privilegiada, uma vez que me encontro numa cidade de cientistas e rodeado de estrangeiros. Tenho um bom emprego (embora que temporário), vivo numa casa confortável, não me queixo do dinheiro que ganho (mais era bom, mas sempre o será, não é?). Ou talvez seja por encontrar ainda no dito período de graça quando sobeja o novo, ou talvez por esta não ser a primeira vez que estou a viver num país estrangeiro. A bem lembrar acho que a experiência de me mudar para Inglaterra em 2001 foi muito mais abrupta e stressante do que esta de vir habitar no Japão. Quaisquer que sejam as razoes, a verdade é que sinto-me bem aqui, tempo presente.
Falando um pouco mais sobre os códigos japoneses. Não deixa de me espantar a forma de eles se vergarem aos condicionamentos sociais, estes sobrepõem-se a qualquer pretensão individual. Por fim, temos a incapacidade do indivíduo de se impor como personalidade, o triunfo de uma sociedade amorfa onde movimentos reivindicativos e organizações de cidadãos tem reduzida expressão. Tudo isto parece resultar num nivelamento conformista onde qualquer ambição para além da média é uma extravagância rara, por vezes mal vista nesta sociedade extremamente hierarquizada. Será portanto natural que a criatividade seja um problema deste povo, a capacidade de impor o novo é fundamentalmente oposta à mentalidade reinante. Eu sei, são clichés o que escrevo, mas na realidade estes repercutem-se seriamente nas pessoas com que aqui me deparo. Uma interessante consequência disto é o Japão ser um país afável, sem grandes convulsões sociais, de reduzida criminalidade, onde tudo está organizado para a serenidade, a pouca confrontação. Na verdade, isto é como um jardim encantado onde uma pessoa, quase de forma inconsciente, se deixa paulatina e docilmente adormecer.
Falando um pouco mais sobre os códigos japoneses. Não deixa de me espantar a forma de eles se vergarem aos condicionamentos sociais, estes sobrepõem-se a qualquer pretensão individual. Por fim, temos a incapacidade do indivíduo de se impor como personalidade, o triunfo de uma sociedade amorfa onde movimentos reivindicativos e organizações de cidadãos tem reduzida expressão. Tudo isto parece resultar num nivelamento conformista onde qualquer ambição para além da média é uma extravagância rara, por vezes mal vista nesta sociedade extremamente hierarquizada. Será portanto natural que a criatividade seja um problema deste povo, a capacidade de impor o novo é fundamentalmente oposta à mentalidade reinante. Eu sei, são clichés o que escrevo, mas na realidade estes repercutem-se seriamente nas pessoas com que aqui me deparo. Uma interessante consequência disto é o Japão ser um país afável, sem grandes convulsões sociais, de reduzida criminalidade, onde tudo está organizado para a serenidade, a pouca confrontação. Na verdade, isto é como um jardim encantado onde uma pessoa, quase de forma inconsciente, se deixa paulatina e docilmente adormecer.
Mas já basta de divagações. Esta semana trouxe umas novidades – a primeira, um show de Flamenco (raríssimo por estas bandas) e depois, uma bem-vinda descoberta, o único Jazz-Bar cá do sítio. E com música ao vivo todos os Sábados! Entretanto, cá vai mais uma foto dos produtos das minhas aulas de caligrafia. Desta feita, expuseram na entrada da residência os nossos rolos de caligrafia – o meu é o segundo a contar da esquerda, com a palavra “Serendipity”.
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